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29 de julho de 2013

A revolta será curtida e compartilhada (2)

Esta série de posts (que na verdade é só um, dividido para facilitar a leitura) foi um relato pessoal produzido sobre as primeiras manifestações ocorridas nas cidades de Niterói e Rio de Janeiro. Ele está um pouco desatualizado, porque não leva em consideração a continuação dos protestos, mas acho importante deixar registrado aqui - até mesmo para que eu tenha acesso no futuro.
Acesse o post 1 aqui                                                                  
                                                               Post 2 de 5.


                                       Niterói – 14 de junho


No primeiro ato, seguimos pela Avenida Amaral Peixoto, com gritos de ordem puxados pelo carro de som. Quando este se calava, parecia uma marcha fúnebre. Era como se aquelas pessoas precisassem de um controle, um pastor, alguém para guiar o que deveríamos falar. Continuamos andando até a Câmara de Vereadores de Niterói, e rapidamente tomamos conta do local. Pessoas subiram na estátua principal, arrancaram bandeiras, e gritávamos revoltados, contra a opressão de tantos anos. 

Mas o carro de som continuava em nossos ouvidos, tentando abafar as múltiplas e heterogêneas vozes, servindo de palanque para o “um ou outro” partido político lá presente. Eu estava na frente, e via meus amigos, e também desconhecidos querendo falar, tentando mobilizar as pessoas a voltarmos para o terminal, onde alcançaríamos a verdadeira massa que sofre com o transporte público cotidianamente. Mas alguns controlavam aquele carro, e só quem era de seus partidos podia pegar o microfone. Entoamos um grito de “não me representa”, e seguimos de volta para o terminal. Os manifestantes deixaram o carro de som pra trás, e cantamos, nos ouvindo, dando as mãos para conseguir passar com o sinal aberto, fazendo um cordão de pessoas que nunca tinham se visto na vida, mas estavam na mesma luta.

E assim chegamos ao terminal, onde ficamos gritando palavras de ordem para motoristas e cobradores que buzinavam demonstrando seu apoio, e balançavam a cabeça negativamente quando perguntados se seus salários tinham aumentado.    
       
De repente um grupo de pessoas anunciou que o choque tinha chegado, e que teríamos cinco minutos para sair das ruas, e deixar o trânsito fluir. Alguns queriam resistir – acredito que pela emoção do momento, pelo desejo de continuar aquela manifestação, pela necessidade de desobedecer às ordens do Estado pelo menos uma vez na vida – mas a maioria deixou as ruas e dispersou.

Eu estava procurando meu grupo de amigos quando a primeira bomba de gás lacrimogêneo estourou. Embebedei um pano de vinagre e passei no rosto, entregando em seguida para outras pessoas que estavam em volta. Quando finalmente abri os olhos percebi que muitos manifestantes tinham corrido para dentro do terminal, e pensei: estão encurralados.

 Segundos depois o choque arremessou uma bomba dentro do terminal. Me desesperei pelos meus amigos, pelos passantes, que saíam do lugar esfregando o rosto com as mãos, jogando água, sem saber que isso piora o efeito do gás. Vi meu amigo reaparecer com um vidro de vinagre e sair jogando nas pessoas, sem nem explicar a razão, e vi os rostos de questionamento e indignação se transformarem em alívio e agradecimento em questão de segundos.

Éramos um grupo de 12 pessoas, mas estávamos perdidos. Eu e mais três decidimos ir embora para a Cantareira e tentar localizar os outros. Saímos do terminal e passamos em frente ao choque, segurando seus cachorros e prontos para tacar mais bombas ou spray de pimenta naquela população frágil e desarmada. Quando estávamos no caminho Niemayer, percebemos que um carro do choque estava nos seguindo. Paramos e esperamos um grupo maior se aproximar.


Quando passamos pelos policiais, eles pediram que parássemos e revistaram meu amigo. A primeira pergunta foi: “vocês estavam naquela manifestação, não é?”. Imediatamente saquei meu celular e comecei a filmar a ação. Um dos policiais fez o mesmo e disse que também me filmaria. “Mas você está em serviço, eu não”, afirmei. “Não interessa, você tá me filmando eu vou filmar você também!”, foi o que ele me respondeu. Felizmente tinha um advogado no grupo maior, e fomos liberados sem grandes problemas. 

Mas tenho uma sincera impressão que se tivéssemos continuado - só os quatro - terminaríamos a noite na delegacia. E essa era só mais uma prova do quão baixo os policiais escalados para reprimirem as manifestações em todo Brasil estavam jogando. E eu sabia que era só o começo.

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